terça-feira, 17 de agosto de 2010

DOIS POETAS, UM VIBRADOR E UMA MANHÃ VELOZ!

Ia passando pela praça Heliodoro Balbi, no centro de Manaus, quando escutei aquela voz suave:
-Ei,poeta!
Como a praça tem o nome de um sonetista parnasiano do Ciclo da Borracha, pensei que o grito poderia ser de algum louco,chamando pela alma do poeta Heliodoro.
-Ei,poeta, insistiu a voz.
Como sou mais dramaturgo e contista que poeta, não levei a sério o grito.
-Poeta, poeta...
Olhei e vi o poeta T. Foi a glória porque não sendo poeta, tendo 45 anos e sendo reconhecido por um poeta verdadeiro de 83 anos, nada melhor para começar bem o dia. T. é um dos fundadores da Geração Madrugada, que em 1953, nesta mesma praça,55 anos atrás, inaugurou oposição ao parnaso-simbolismo da Academia Amazonense de Letras, propondo uma poesia modernista.
- Poeta,sinto-me honrado,rapaz, como você está? afirmei e perguntei.
- De saúde bem, de poesia mais ou menos, afirmou ele, mas com um problema que um rapaz jovem como você pode me acudir.
- Você que manda, afirmei.
- Poeta, é o seguinte, disse T., estou procurando um sex-shop porque preciso comprar um vibrador...
- Ora, não seja por isso, meu grande poeta.Vamos aqui. Conheço um, informei.
- Olhe lá...
- Deixa comigo, T.
Chegando no Sex-Shop Manaus, o poeta ficou meio tímido, receoso de entrar.
- Deixe comigo, falei para ele.
- O senhor tem vibrador? Perguntei ao atendente.
- Como assim, respondeu o moço, o senhor pode me explicar melhor?
- Claro, afirmei, é aquele aparelho que as pessoas interessadas introduzem no ânus...
O atendente corou e, quando olhei para trás, vi apenas o calcanhar do poeta dobrando a porta de saída.
- Tem não, senhor, respondeu o atendente. Mas no Sex-Shop lá do Manaus Shopping, na Eduardo Rineiro, o senhor encontra.
Agradeci e corri atrás do poeta T.
Já o encontrei novamente sentado em um banco da praça Heliodoro Balbi, esbaforido. Quando me viu, o poeta nem me esperou sentar.
- Você é louco, rapaz, disse-me aborrecido, suando e ainda vermelho de constrangimento. Como é que você faz uma coisa desta, afirmou, ainda irritado com o meu comportamento.
- O que foi que eu fiz? Perguntei. O atendente queria saber mais especificações do produto e eu tive que esclarecê-lo, poeta, que mal há nisso?
- Era para umas amigas minhas, rapaz...
- Eu sei disso...
- Então...
- O atendente falou que lá não tinha, mas indicou um outro lugar. Vamos lá,poeta, desconversei.
Ainda resmungando, mas precisando do produto, o poeta T. me acompanhou.
No outro sex-shop, antes de entrar, mandei-o aguardar do lado de fora. O poeta agradeceu, porém colocou a orelha para dentro da loja, pois queria escutar o diálogo.
Entrei e perguntei para o atendente: tem vibrador?
O atendente era mais esperto que o outro e foi logo adiantando: de vários tamanhos e sabores.
- Sabores? perguntei.
- Sim,inclusive sabores regionais, como açaí,abacaba,camu-camu, graviola e cupuaçu.
Ri e quando olhei para trás para perguntar a preferência do poeta, ou de suas amigas, ele já vinha entrando na loja animado e com um humor completamente diferente ao da praça.
- Um de graviola e um de açai,afirmou, surpreendendo-me pelo desembaraço...
- Poeta, mas o tamanho? perguntei.
- Isso é comigo, rapaz, já me descartando e pedindo para eu aguardar na praça.
- Mas não íamos beber uma cerveja, antes de encontrar suas amigas?
- Espere-me lá, sentenciou, com próclise.
Notei sua pressa e marquei a cerveja para um próximo encontro.Não queria interromper os compromissos de alguém que me honrou com a alcunha de poeta. Ainda mais de alguém com 83 anos.
Ri novamente e saí. Contei pela milésima vez o número de oitizeiros plantados na praça do poeta Heliodoro. Admirei as orquídeas e as bromélias vermelhas. Parei diante do Mulateiro e confirmei que continua engolindo as placas de homenagem ao Clube da Madrugada, fixadas em seu caule. Pensei que é um desperdíco de água o chafariz e uma andorinha quase acerta minha cabeça com uma bolinha de cocô. Resolvi deixar de ser alvo e comecei a visitar os Sebos, começando pelo O Alienista, do meu amigo Lê. Dentro da manhã veloz!

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